Para o professor de Economia Internacional a CIA foi
responsável pelo assassinato de Celso Daniel para colocar Palloci na assessoria
econômica no governo Lula, e pelo assassinato de Eduardo Campos para colocar
Marina Silva na presidência do Brasil.
¨Celso Daniel foi apresentado por Lula numa
reunião de empresários no Rio, na campanha de 2002, como seu principal assessor
econômico. Sobre Palocci, que estava presente na mesma reunião, o então
candidato a Presidente pouco disse. Dias depois Celso Daniel foi assassinado e
Palocci assumiu seu lugar na assessoria direta a Lula. Marina Silva era uma
coadjuvante de pouca expressão na campanha de Eduardo Campos até que o acidente
que o matou catapultou a candidatura dela na base da comoção nacional. Assim
como Aécio, Eduardo, a frio, não tinha a menor chance de eleição. Marina tem.
O que Marina e Palocci tem em comum, além de beneficiários de assassinato e
acidente em pleno jogo do poder, é uma explícita adesão à política imperial
norte-americana. Palocci tentou empurrar a ALCA- Associação de Livre Comércio
das Américas goela abaixo do povo brasileiro, conforme ficou comprovado por
Wilkleaks. Só não conseguiu porque Lula, influenciado por Celso Amorim e Samuel
Pinheiro Guimarães, evitou o desastre. A assessoria de Marina já anunciou o
propósito de promover tratados bilaterais de livre comércio com a União
Europeia e EUA. E um recuo em nossa relação com os BRICS.
Deixemos de lado teorias conspiratórias e fiquemos apenas nas coincidências. O
Governo norte-americano não faz segredo para ninguém que seu objetivo
estratégico é abrir espaço no mundo para suas empresas. A isso chamam de
promover a livre iniciativa e a democracia. De acordo com as conveniências,
tomam como rótulo também a promoção dos direitos humanos. Mas só os ingênuos
acreditam que isso seja o eixo de suas relações internacionais. Elas são
movidas antes de mais nada pelos interesses econômicos privados dos cidadãos
norte-americanos que mandam efetivamente em seu governo, em especial a ala
republicana.
Na Guerra Fria, quando havia uma justificativa ideológica para encobrir os
reais interesses norte-americanos, o Departamento de Estado e a CIA sempre se
acharam no direito de promover assassinatos e golpes de estado em nome do mundo
livre, como foi no Chile de Allende, segundo documentos do Governo americano
recém-liberados. Patrício Lumumba, um secretário-geral da ONU de tendência
socialista, morreu num suspeito desastre de avião na África. Guatemala e
Granada, na América Central, sofreram invasões e golpes de estado patrocinados
diretamente pelos americanos. Só Coreia, Vietnã e Cuba conseguiram resistir com
algum grau de ajuda soviética.
Com o fim da Guerra Fria era de se esperar que a política de poder imperial dos
Estados Unidos transitasse das formas autoritárias e sanguinárias de controle
para artes mais persuasivas. Esta de certa forma era a expectativa do mundo
porque, com o fim do império soviético, não havia mais um poder
econômico-militar em condições de desafiar os EUA. Entretanto, surgiu um
problema: como legado da Guerra Fria, a Federação Russa, embora enfraquecida
militar e economicamente, manteve-se como um poder nuclear em pé de igualdade
com os EUA. É que o poder nuclear se nivela por baixo.
Nem os mais desvairados estrategistas norte-americanos proporiam uma guerra
direta com a Federação Russa, por razões óbvias. Daí que a estratégia americana
implementada pelo braço agressivo e provocador da OTAN passou a ser resgatar do
armário antigos textos geopolíticos e estrangular progressivamente a Rússia em
si mesma pela cooptação de seus antigos satélites. Em 1999, entraram na OTAN a
República Checa, a Hungria e a Polônia. Em 2004 veio o segundo round, com a
entrada de Bulgária, Estônia, Letônia, Lituânia, Romênia, Eslováquia e
Eslovênia, tudo sob protestos da Rússia baseados em acordos feitos antes de
unificação alemã e agora violados.
Na sequência, em 2008, os EUA propuseram abertamente a admissão de Geórgia e
Ucrânia. França e Alemanha se opuseram com receio de hostilizar ainda mais a
Rússia. Daqui em frente cito a “Foreign Affairs” de setembro/outubro, uma das
mais prestigiosas revistas do estabelecimento político norte-americano:
“Alexander Grushko, então vice-ministro da Rússia, disse: 'A entrada de Geórgia
e Ucrânia na Aliança é um imenso erro estratégico que teria as mais sérias
consequências para a segurança pã-europeia'. Putin confirmou que a admissão
daqueles dois países à OTAN representaria uma 'ameaça direta' à Rússia. Um
jornal russo reportou que Putin, falando com Bush, 'muito transparentemente
insinuou que se a Ucrânia fosse aceita na OTAN ela cessaria de existir.”
Não obstante, o Governo americano financiou direta e indiretamente insurgentes
de todos os matizes, inclusive fascistas, neonazistas e antisionistas, para
desestabilizar o Governo legítimo da Ucrânia com o objetivo último de erguer
uma fortaleza da OTAN na fronteira da Rússia. Os passos seguintes são conhecidos:
numa magistral manobra estratégica, Putin usou as demandas e um plebiscito com
os russófilos da Crimeia para ocupar a península; a Ucrânia entrou em guerra
civil, somente suspensa por uma trégua precária; e a OTAN formalizou a entrada
do país como membro, numa direta provocação à Rússia.
Note-se que estrategistas americanos da estatura de um Kissinger manifestaram
em artigos sua opinião de que a Ucrânia não deveria ser incorporada à OTAN, nem
à Rússia, mas constituir uma espécie de colchão entre a Rússia e o Ocidente
fazendo o papel da Finlândia na Guerra Fria. É um conselho prudente se se quer
levar em conta as legítimas preocupações geopolíticas russos com a ameaça de
ter um potencial adversário em seu quintal. Como a crise ucraniana não é só militar,
mas econômica, institucional e social, é possível que Putin simplesmente deixe
a situação ucraniana degenerar-se até a extinção do país numa explosão
entrópica, já que ninguém vai esperar que a Europa falida, e mesmo os EUA, vão
resgatar o país com dinheiro.
Essa “vitória” da adesão à OTAN é similar às “vitórias” americanas na Coreia,
no Vietnã, no Iraque e no Afeganistão: depois de espalhar morte e terror nos
países invadidos, os EUA se retiram sem glória, carregando seus caixões e seus
feridos, e deixando para trás uma terra arrasada entregue aos nacionais para a
recuperação com seus próprios recursos. Jamais tanta força militar bruta foi
usada no mundo com tão poucos resultados positivos, mesmo do ponto de vista do
poder imperialista. O mesmo padrão se aplicou na chamada Primavera Árabe, onde
regimes autoritários da Líbia, do Egito, do Iemen e da Síria foram
desestabilizados por insurgentes financiados pelos EUA e as potências
secundárias europeias, e depois abandonados.
É que também nesse caso o rastro do que ficou foi uma política de terra
arrasada: no Egito, o poder caiu por algum tempo nas mãos de um braço radical
da Irmandade Muçulmana, exigindo a restauração de uma ditadura militar; na
Líbia, o país está retalhado entre mais de 200 milícias armadas, cada uma
mandando em seu feudo e impedindo qualquer possibilidade de eficácia do poder
central; na Síria, a tentativa de desestabilização de Assad resultou na
emergência do Califado, chamado pelos ocidentais de Estado Islâmico, erigido
como o flagelo dos ocidentais. Tudo isso, para resumir, tem sido produto da
estratégia americana de estabelecer um poder absoluto no mundo para o qual é
fundamental neutralizar completamente a Rússia.
É aí que entramos nós. A partir de um acrônimo inofensivo, um grupo de países
denominados BRICS surgiu no horizonte com um potencial considerável de
desconforto para os EUA. São eles Rússia, a superpotência nuclear abertamente
hostilizada por Washington; China, potência nuclear e econômica olhada com
grande desconfiança; Índia, potência nuclear tradicionalmente independente,
Brasil e África do Sul - em geral amistosos com os EUA, não obstante o fato de
que eles grampeiam normalmente os meios de comunicação da maior empresa
brasileira e da Presidenta da República. Isso, talvez porque, no nosso caso,
estejamos buscando, desde Lula, um destino mais autônomo sem prejuízo de nossas
relações amistosas com eles.
Esses países representam mais de um terço da população do mundo, parte
considerável do PIB e, sobretudo, um grande potencial de crescimento que se
compara à estagnação da Europa Ocidental, do Japão e dos próprios Estados
Unidos. Do ponto de vista militar os Estados Unidos certamente não têm por que
temer os BRICS. Entretanto, se esse bloco evoluir para uma articulação
econômica mais profunda isso representará uma perda de espaço para a empresa
norte-americana. Nisso, Washington é implacável. A retórica do livre comércio
não passa de um rótulo ideológico para criar situações favoráveis à empresa
privada dos Estados Unidos ou sócia deles.
Isso significa que, depois de décadas em que temos sido insignificantes no
plano das relações externas norte-americanas, viramos alvo da geoeconomia e da
geopolítica do país. Enquanto os BRICS foram apenas conversa de presidentes e
atos sociais sem consequência, passaram quase despercebidos. Quando decidiram
criar um Banco de Desenvolvimento e um Fundo de Estabilização, ascenderam-se em
Washington todas as luzes vermelhas. Uma dessas luzes vermelhas, por
coincidência, brilhou em Santos na forma de um acidente aéreo que colocou na
linha de sucessão presidencial a mais cândida personagem amiga das ONGs
americanas e dos grandes banqueiros, e hostil aos BRICS e à Unasul. Se ela
ganhar, os Estados Unidos não precisarão de bombardear o Brasil para que
esqueçamos nossas ambições de um caminho autônomo de desenvolvimento. A bomba
virá de dentro.
Detesto teorias de conspiração, mas por que desapareceram com as duas
testemunhas vizinhas do local do acidente de Eduardo que viram, separadamente,
bolas de fogo no motor do jato ainda no ar? Por que a TV Globo, que pôs no ar
as declarações dessas testemunhas, sumiu com elas a pretexto de que foi uma
confusão psicológica? Por que William Waack levou mais de dez minutos no ar
para “explicar” o suposto estado de desorientação do piloto – um piloto
experiente que deveria estar no máximo de sua atenção porque em arremetida? Por
que a única testemunha técnica dos últimos momentos, a caixa preta, não tinha
gravado nada? Não, não foi conspiração. Apenas coincidências. Quanto a mim, “no
creo em brujas; pero que las hay, las hay”!