Linha desativada de 125 quilômetros entre Matias Barbosa e Barbacena recebe aval da ANTT para voltar a operar.
Jornal hoje em Dia 20/12/2010 (Caderno Minas) Ricardo Beghini - Da Sucursal da Zona da Mata.
Um dos projetos mais arrojados de turismo ferroviário do Estado, o Expresso Pai da Aviação deu mais um passo para sair do papel e ganhar os trilhos. A ONG Amigos do Trem, que encabeça a iniciativa desde 2003, recebeu da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) autorização para iniciar as operações num trecho de 125 quilômetros, entre Matias Barbosa, na Zona da Mata, e Barbacena, no Campo das Vertentes. Mas o projeto depende de uma última etapa: a obtenção de recursos para reforma dos equipamentos ferroviários que estão em poder da entidade.
A composição com objetivos turísticos e culturais somente iniciará as atividades após apresentação de laudo técnico “comprovando o atendimento a condições de segurança necessárias ao transporte de passageiros”, diz o texto da autorização, assinado pelo diretor-geral da ANTT, Bernardo Figueiredo, e publicado no Diário Oficial da União (DOU) na semana passada. Na prática, os equipamentos cedidos a ONG precisarão passar por uma ampla reforma.
“A expectativa é grande não só da entidade, mas também das populações envolvidas direta e indiretamente no projeto, já que temos os equipamentos ferroviários, a concordância oficial da empresa que opera a linha e o apoio do Governo federal”, afirma Paulo Henrique Nascimento, presidente da Amigos do Trem, reconhecida, em 2004, como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip).
Um estudo de viabilidade encomendado pela entidade revela que o projeto conta com a aprovação de 92% dos moradores das cidades por onde o trem irá passar. A pesquisa foi feita por professores e alunos das universidades federais de Juiz de Fora (UFJF) e Viçosa (UFV).
Para a implantação do Expresso Pai da Aviação, a Amigos do Trem conta com quatro locomotivas, seis vagões e duas automotrizes, também conhecidas como litorinas (veículo autônomo com capacidade para 80 passageiros, equipado com dois motores, e que independe de locomotiva para se locomover). Estas últimas serão usadas na primeira fase do Expresso Pai da Aviação. Os equipamentos, cedidos pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), estão estacionados em um pátio ferroviário de Juiz de Fora.
O projeto foi dividido em dois módulos operacionais. O primeiro percorrerá um trecho de 69 quilômetros, nos municípios de Juiz de Fora, Ewbank da Câmara e Santos Dumont, ligando os museus Mariano Procópio e Cabangu, onde nasceu o Pai da Aviação. O percurso será feito numa automotriz.
Para a primeira etapa, a entidade necessita de R$ 350 mil para a reforma da litorina e qualificação do pessoal responsável pela operação. “A automotriz passará por uma reforma geral, modernização dos sistemas elétricos e de comunicação, visando atender às condições operacionais do transporte ferroviário de passageiros”, revela Paulo Henrique, que desde 1997, com a privatização do setor e o fim dos trens de passageiros, luta pelo resgate dessa modalidade de transporte.
Segundo ele, a entidade já estabeleceu negociações com a iniciativa privada e com o próprio Governo federal para obter os recursos iniciais para a reforma de todos os equipamentos. As empresas interessadas em parcerias poderão deduzir o investimento no Imposto de Renda e divulgar as marcas no projeto. Depois da recuperação, serão necessários de três a seis meses para o início da circulação, uma vez que a malha ferroviária da região está em boa condição de uso.
De olho nos turistas de 2014
A expectativa da ONG Amigos do Trem é que o Expresso da Aviação esteja operando em sua totalidade até a Copa de 2014, com a ampliação do trajeto para as cidades de Matias Barbosa, Antônio Carlos e Barbacena. A ideia é colocar nos trilhos a composição principal, formada por duas locomotivas e seis vagões, dois quais quatro destinados a poltronas e dois para restaurantes.
“Com o sucesso do módulo um e o interesse dos municípios, o projeto poderá ser expandido, mas tudo dependerá das negociações entre os prefeitos e a empresa MRS Logística, que tem a concessão da linha”, salientou. Além disso, Paulo Henrique ressalta que será necessário verificar a viabilidade econômica do percurso, que terá 125 quilômetros.
A ampliação do projeto prevê parcerias com o Sebrae Nacional e com a Associação Brasileira das Operadoras de Trens Turísticos Culturais para a qualificação dos profissionais que atuarão no entorno das estações, como artesões, comerciantes e setor hoteleiro. “Queremos oferecer um alto padrão de qualidade no atendimento aos usuários do Expresso Pai da Aviação. Também é nossa intenção é que em cada parada haja a apresentação de um grupo folclórico de dança e teatro, contando a história de cada município”.
O ferroviário aposentado Carlos Alberto Guimarães, 59 anos, comemora os avanços que permitirão o começo do Expresso Pai da Aviação. Depois de passar por um período de treinamento, ele será o maquinista da futura composição. Carlos Alberto esteve na ativa entre 1973 e 2001, inicialmente atuando na antiga Rede Ferroviária Federal (RFFSA), e concluiu as atividades na companhia MRS Logística.
O trem é mais seguro e confortável do que o ônibus. Com o espaço a mais, os passageiros podem apreciar a paisagem e bater um papo ao mesmo tempo”, ressalta Carlos Alberto, que já operou uma automotriz quando o veículo circulava entre Juiz de Fora e Santos Dumont. Ele também foi maquinista do Expresso Vera Cruz, que ligava o Rio de Janeiro a Belo Horizonte.
Passagem com preço popular
A proposta da primeira etapa do Expresso Pai da Aviação, entre Juiz de Fora e Santos Dumont, prevê a operação somente nos fins da semana, com saídas no meio da manhã da Estação Central de Juiz de Fora. “Teremos preços populares para atender todas as classes. Também realizaremos passeios sociais sem custos financeiros com estudantes da rede pública e idosos” conta Paulo Henrique.
Os principais atrativos turísticos da fase inicial serão dois dos mais importantes museus mineiros. O trem fará uma parada na Estação do Museu Mariano Procópio, que, desde janeiro, vem sendo reformada pela Prefeitura de Juiz de Fora. A estação, tombada como patrimônio do município, foi construída no fim do século XIX para atender à Estrada de Ferro Dom Pedro II. Cerca de R$ 550 mil estão sendo investidos na recuperação do imóvel.
Atravessando a rua que separa a estação do museu, os turistas poderão apreciar as atrações do Complexo do Museu Mariano Procópio, o primeiro museu de Minas, que conta com parque de 78 mil metros quadrados, equipado com restaurante, pedalinhos, jardim histórico, pista de caminhada, além de rica fauna e flora.
Nos prédios do museu, na parte mais alta da área, que permanecem fechados para reforma, os visitantes poderão, no futuro, conhecer um dos maiores acervos imperiais do país, incluindo os trajes usados na coroação, da maioridade e do casamento de D. Pedro II, além do traje de corte da Princesa Isabel. Mas o local está passando por reformas e só deve ser reaberto após dois anos.
Seguindo viagem, e depois de paradas em estações de Ewbank da Câmara e Santos Dumont, o ponto final do Expresso Pai da Aviação será no Museu de Cabangu, a 16 quilômetros da sede do município, no sítio onde nasceu o mineiro que foi pioneiro dos ares. No local, estão guardados objetos pessoais e fotos, além de um museu da aviação, com réplicas dos balões e do avião 14 Bis, desenvolvidos por Santos Dumont, em Paris, no fim do século XIX. O acervo está sob a guarda do Ministério da Aeronáutica.