Estação Ferroviária da cidade de Janaúba - ABouchardet(2006) |
Aposentados há quase duas décadas, os trens de passageiros podem voltar à ativa como paliativo do problema de mobilidade urbana enfrentado pelo país. Num último passo para o desenvolvimento integrado dos modais de logística, o Ministério dos Transportes deve detalhar nos primeiros meses de 2012 um plano bilionário para revitalização de mais de 2 mil quilômetros de linhas férreas nos quatro cantos do país. Ao todo, devem ser alocados R$ 7 bilhões do Plano Plurianual 2012–2015 para que 28 trechos voltem a funcionar, permitindo a retirada de veículos das BRs e reduzindo o nível de saturação das estradas.
Inicialmente devem ser priorizados 14 segmentos identificados pelos levantamentos feitos ainda na década de 1990 pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Em Minas, estão localizados dois desses trechos: o ramal que liga Belo Horizonte às cidades de Ouro Preto e Conselheiro Lafaiete e o que liga três das principais cidades do Norte do estado: Bocaiúva–Montes Claros e Janaúba. “No Brasil, grandes extensões de vias férreas apresentam níveis muito reduzidos de utilização ou encontram-se mesmo em plena ociosidade. A ideia é usar a ferrovia em benefício direto da população, que, durante anos, enxergou as linhas como um intruso que trazia barulho, risco de acidente e outros ônus”, afirma o diretor do Departamento de Relações Institucionais do Ministério dos Transportes, Afonso Carneiro Filho.
O governo federal decidiu envolver o setor ferroviário na discussão sobre mobilidade em 2003, quando foi lançado o Programa de Resgate do Transporte Ferroviário de Passageiros. Composto por três projetos – alta velocidade; turístico e regional de passageiros –, o objetivo é resgatar as ferrovias do cenário de abandono e transformá-las em parte de um modelo eficiente de transporte de pessoas, criando uma alternativa às saturadas rodovias. Nesse sentido, a proposta inicial é ligar as chamadas cidades-polo às capitais e também conectar eixos regionais importantes.
No caso do ramal que interliga BH–Ouro Preto–Conselheiro Lafaiete, o trecho faz parte da Estrada de Ferro Central do Brasil – rede ferroviária desenvolvida no Brasil Império, por dom Pedro II, para integração das províncias de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Criada há quase 150 anos, a estrada – eixo-chave também no transporte de minério – parou de funcionar por volta de 1980 e deve voltar com velocidade mais alta (80 km/h) e características mais modernas.
O Ministério dos Transportes encaminhou uma emenda ao Plano Plurianual 2012–2015, prevendo investimentos de R$ 3 bilhões para os próximos quatro anos em conjunto com os governos estaduais. A proposta é iniciar os estudos de viabilidade paralelamente aos projetos de engenharia no primeiro trimestre do próximo ano e começar a revitalização das linhas no ano seguinte – exceção para dois ramais previstos para o Rio Grande do Sul e o Paraná, que já contam com os projetos e devem começar as obras ainda em 2012. “É um programa que deve perdurar mais de um governo. Não é vapt-vupt. É preciso um rearranjo estrutural que requer tempo e investimento”, afirma o diretor do Ministério dos Transportes, Afonso Carneiro Filho. Na proposta, a previsão é de que parte dos modais deve ser viabilizada por meio de parceria público-privada.
Na segunda etapa, em parceria com a Agência de Desenvolvimento Metropolitano de Belo Horizonte, órgão ligado ao governo de Minas, devem ser feitos projetos para mais dois ramais em Minas: BH–Sete Lagoas e BH–Divinópolis–Itaúna. A primeira linha deve cruzar as cidades de Santa Luzia e Confins, alcançando o Aeroporto Internacional Tancredo Neves, e com a última parada na estação do Bairro Horto, na Região Leste da capital. Enquanto isso, o segundo segmento deve beneficiar o Vetor Oeste da região metropolitana, ligando as duas maiores cidades da Grande BH – Contagem e Betim – a dois dos principais municípios do Centro-Oeste: Divinópolis e Itaúna. O ponto final, nesse caso, seria na Estação Eldorado do metrô.
Trecho que ficou na saudade
Por décadas, o trem de passageiros que circulava entre Belo Horizonte e Monte Azul (Norte de Minas) marcou a vida de muita gente, movimentando os pequenos municípios do Norte do estado e facilitando a vida das pessoas mais simples, por causa do preço mais barato da passagem. Mas tudo que era proporcionado pelo “trem do sertão” ficou só na saudade a partir de setembro de 1996, quando ele deixou de rodar. O anúncio da possível volta do trem de passageiros e carga interligando Bocaiúva, Montes Claros e Janaúba cria um novo alento na região.
Mas para a volta do trem de passageiros será necessária também a recuperação das estações ferroviárias. O trecho da antiga Rede Ferroviária Federal (RFFSA) entre Belo Horizonte e o Norte do estado está sendo explorado pela Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), que realiza somente o transporte de cargas. A FCA não cuida das antigas estações de passageiros. Por isso, muitas delas estão em ruínas. “As nossas rodovias estão sobrecarregadas. O trem de passageiros virá para desafogar as estradas e modernizar o transporte, além de atender a questão do turismo”, afirma Alberto Bouchardet, líder do movimento “Trem Baiano”, que há anos luta pela retomada do transporte ferroviário de passageiros no Norte de Minas.
Apesar de o projeto Programa de Resgate do Transporte Ferroviário de Passageiros priorizar a conexão de cidades-polo com capitais, a inclusão do trecho do Norte de Minas é justificada pela importância do transporte para a região. Por décadas, segundo o diretor do Departamento de Relações Institucionais do Ministério dos Transportes, Afonso Carneiro Filho, o acesso a Montes Claros foi feito essencialmente pela ferrovia, tendo em vista as condições das rodovias, que, muitas vezes, nem mesmo eram asfaltadas. “A produção agrícola da região era transportada pelo trem”, afirma, ressaltando que no Norte do estado a linha deve ser compartilhada entre carga e passageiro. (Com PRF)
Metrô integrado
Somando os três ramais que passam pela região metropolitana, a proposta é fazer um semianel contornando a Grande BH e alcançando importantes municípios de regiões vizinhas. Parte do modelo deve integrar-se ao metrô, com intervalos entre as viagens variando de três a 15 minutos numa via exclusiva; os demais devem aproveitar as linhas de carga num modal misto metropolitano. Nesse segundo cenário, o transporte serviria para atender trechos com demanda menores e, por isso, o total de viagens seria reduzido, com intervalo de viagens variando de 15 a 60 minutos (metropolitano) e 5 a 6 horas (intermunicipal). “O trem de passageiros permite também que sejam transportadas mercadorias, pacotes e encomendas de alto valor agregado, como eletrônicos, e ainda distribuição de cargas aéreas”, afirma Afonso Carneiro Filho, do Ministério dos Transportes.
Pedro Rocha Franco
Luiz Ribeiro
Publicação: 05/12/2011
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